sexta-feira, junho 30, 2006

Representar.

O Assunto do momento é o Mundial. Não vale a pena negar.
Hoje vou-me dedicar a um assunto tantas vezes negligenciado, mas que se tem revelado fundamental neste mundial e na nossa equipa: a arte da representação.
Pois é. No final de um em cada 5 treinos, há sempre duas a três horas para ensinar aos futebolistas a arte de representar:
Professor - Figo, tu que estás mais batido, mostra como se faz a resposta a uma agressão nas pernas com o adversário a sacar-te a bola.
Figo atira-se para o chão, contorce-se de dor, um esgar de sofrimento trespassa a sua cara, uma lágrima desponta-lhe nos olhos e da sua boca sai um grunhido quase inaudível, mas que demonstra grande sofrimento.
P – Magistral, um pouco de overacting, mas magistral. Vejam a expressão de sofrimento e a lágrima que quase lhe sai, mas não sai dos olhos. Ricardo faz a tua simulação de uma defesa espectacular seguida de alguns momentos no chão para ganhar tempo.
Ricardo atira-se para o ar simulando que captura a bola em movimentos exagerados e deixa-se cair sem se conseguir defender, porque finge que segura nas mãos a bola. Já no chão, sempre mantendo a bola fictícia entre as mãos, em posição fetal, finge que o corpo lhe dói da pancada seca contra o chão. Levanta-se com dificuldade, agarrado aos lombos e simula que sente dificuldade em manter-se erecto (problema que afecta 60% da população com mais de 65 anos – este comentário teve o patrocínio do Viagra).
P - Bonzito, mas há que ter atenção na parte em que te levantas, para não te estares a rir e a fazer o sinal de ok com o dedo. Tira credibilidade à manobra.
Agora tu Simão, a técnica que ensaiamos da última vez, de uma agressão com o cotovelo na cara.
Simão, finge iniciar uma corrida e estaca de repente levando as mãos à cara. Abre a boca e grita “háááá” caindo para trás e esfregando a cara com as mãos em concha, como se segurasse uma flor. Depois põe-se de joelhos como se rezasse, e contorce o corpo em espasmos sincopados de dor.
P - Simão, está demasiado. Assim parece que foste atingido por um pontapé na cabeça. Acho que estás a trocar os actos. Agora tu Cristiano. Finge um ataque fulgurante.
Cristiano pega numa bola e impulsiona o seu corpo musculosos em frente. Estaca como se tivesse um inimigo imaginário à sua frente e faz uma cara de esforço sublime. Finta uma, finta duas, finta três vezes o inimigo imaginário. Chuta a bola sobre si mesmo, recebe, finta outra vez e quando vai avançar …perde a bola. Depois pára e chora.
P – Tudo perfeito. A cara de esforço seria suficiente para intimidar o adversário. A única parte má é que quando avanças perdes sempre a bola. Acho que está demasiado compenetrado na representação e esqueces o objectivo de marcar os golos ou passar a bola. A parte de chorar, já te expliquei que esta apenas reservada para as derrotas. Não podes estar sempre a chorar por tudo e por nada.
Cristiano – Yá cule, man. Boys don’t cry.
Figo – Olha, o puto já aprendeu mais umas palavras.*

*Esta piada, muito engraçada, vem na sequência do post “Conversa de Balneário”. Vale a pena ler.

1 comentário:

Kinder disse...

Reinu, mas tu andas a guardar os textos para as sextas?