Lia num conhecido matutino, que uma produtora fez transportar a cassete (aproveito e acrescento um pormenor técnico importante: a cassete será uma betacam digital SP), com o último episódio de uma série televisiva num carro blindado. Até aqui tudo bem, não podia ser de outra forma, dado a importância da coisa de per si. Mas, e qual raio em tempestade, subitamente caí em mim e senti um baque. Quando finalmente me levantei, limpei os joelhos, clariei a minha mente perturbada e consegui ler para lá da notícia. E senti um vazio, quem nem a dobrada do almoço consegui preencher, apesar de estar a arrotar imenso. Senti que aquilo que mais receava ia acontecer. Apercebi-me - mais do que isso, realizei - que era o fim. As minhas entrenhas estremeceram pela acção conjunta da emoção e da dobrada (o meterorismo invadiu-me).
Senti que a minha companhia de tantos e tantos jantares me ia abandonar. Ia ficar sem a novela da noite. Tinha dúvidas. Será que agora ao jantar, vou ter que voltar a falar com a minha mais que tudo? O que vou fazer? Deixei de ter um objectivo para as minhas noites. As minhas noites eram reguladas pelos horários incertos em que a que TVI se lembrava de emitir os episódios. Para mim a noite tinha o A.N.C.TU e o D.N.C.TU. Agora, será um vazio, um buraco para preencher, que terei que juntar aos 6 ou 7 que já tenho. As dúvidas continuavam. Terei que ler? Se sim, terá que ser Saramago? Ou posso ler Margarida Rebelo Pinto? Terei que voltar a sair com os meus amigos?? Que amigos? Terei que voltar ao cinema? Terei que voltar a fazer sexo? Ou em vez disso, masturbo-me?
Tenho medo. Muito.
Não mais poderei voltar às conjecturas que preenchiam as minhas noites: Será que elas nas festas vão levar aqueles vestidos que deixam ver as mamas? Será que a filha da Luísa vai usar aquela mini saia que deixar antever as coxas? Será a Luísa usa ainticoagulantes para tratar o aneurisma? E se sim, qual a posologia? Que cilindrada tem o BMW da actriz principal? Será que a o sidecar do Miguel já fez a revisão dos 10.000Km? Será que o animal a quem retiraram o veneno era mesmo um Escorpião (Do lat. scorpione. Designação comum aos animais artrópodes, escorpionídeos.), ou um simples lacrau?
A Teia e o enredo de episódio para episódio tinham a capacidade de todos prender, e por razões diferentes todos queriam ver. Em casa, maridos e mulheres que já mal falavam, discutiam agora com alegria se no final ela ia ser feliz e se o Mário efectivamente casaria com a Paula depois da rejeição que sofrera e que o tornara de um ser pacífico, num implacável homem de negócios. Era essa a beleza da coisa.
Esta novela mais do que um vazio de vidas a decorrer à nossa frente, ensinou-nos valores. Ensinou-nos que numa sociedade contemporânea, em que o dinheiro surge como prioridade, é o amor a grande arma que possuímos na conquista da felicidade. Retrata de forma brilhante a correria frenética do proletariado que vive entre a grande cidade e os seus arrabaldes, numa demonstração do que é a luta permanente para a conquista dos sonhos que dão luz e beleza à existência humana.
E ensinou-nos que mesmo na adversidade a vida continua. Por isso, depois de me ter perdido encontrei-me. Estava no trabalho. E depois do meus desespero incial, decidi lutar. Agora digo, com alegria:
Adeus, "Ninguém como tu". Viva “Dei-te quase tudo.”
3 comentários:
Se ha alguma coisa que deveria ser transportada num carro blindado, era você, seu sabujo.
"Dei-te quase tudo" em vão. Realmente, como namorado, não há "ninguém como tu"! Deixa-te lá estar a ver as novelas que eu vou à minha vida com outro!
Eu estou tão ansioso com esta nova novela que queria ver o final dela já amanhã.
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